domingo, 1 de fevereiro de 2015

Me compadeço

Por Fernanda Pompeu

Respeitar o medo do outro foi uma conquista da minha vida adulta. Na infância lembro de uma cena, no Posto 6 de Copacabana, em que zombei do meu primo Walter. Bastava a água bater em seus joelhos para ele se encher de paúra. Eu, que me achava corajosa, ria na cara dele. Depois a vida - sempre ela - se encarregou de desvelar os meus próprios medos. Alguns tão ferozes que amarelaram minha alma. Entre eles, sofri por alguns anos do pavor de aviões. Uma vez, convidada a um festival de Vídeo em Brasília, declinei da passagem aérea, paga pela organização, para amargar cerca de quatorze horas dentro de um ônibus. Decrépito, sacolejante, quente.

Também tive a síndrome do pânico. Não podia pegar trens de metrô, pois parecia que ia sufocar. Não conseguia entrar em filas, particularmente as de agências bancárias, parecia que eu ia desfalecer. Nessa época, gastei uma fortuna em táxis. Como ainda não existiam caixas eletrônicos, implorava a corações amigos que pagassem contas e descontassem cheques para mim. Curada do medo de voar e da síndrome do pânico - que assim como surgiram do nada, desapareceram - tive medo de morrer de câncer. Foi detectado um pólipo na minha bexiga e depois de retirado fui submetida a três anos de monitoramento. Assim, por 36 meses, vivi com a dúvida. Até o dia que o doutor me deu alta, ou eu decidi que ele havia me dado alta, e comemorei com um sorvete La Basque. Isso foi há quinze anos.

Mas resolvidos esses medos tangíveis, ainda me debato com os pânicos de fundo. O pior deles, o da perda de pessoas amadas. O medo monstro que experimentei quando percebi que meu pai estava morrendo. O tremor que sinto a cada aniversário da minha mãe, quando ela vai inexoravelmente envelhecendo. O do meu próprio envelhecimento e a visão aguda de que eu também me aproximo ao the end. A percepção afiada de que o meu passado é bem mais extenso do que o meu futuro.

Não desnudo meus pavores por nenhum mórbido exibicionismo, apenas para registrar o quanto, hoje, eu respeito o medo das pessoas com quem encontro formal ou intimamente. Ao me relacionar com elas quero saber de suas necessidades, realizações, sonhos. Mas, principalmente, tento apreender quais são os seus temores. Isso expande minha compreensão e empatia. Pois, no cardápio dos medos, os diferentes se tornam mais iguais.

(TODO MUNDO TEM MEDO DE ALGUMA COISA, NÃO CONHEÇO QUEM NÃO OS TENHA, EU TENHO. QUANDO ERA CRIANÇA, ESTUDEI NUMA ESCOLA ANTIGA, E QUE TINHA MUITAS ARANHAS MORANDO NO FORRO DO TELHADO. NUNCA MAIS ME LIVREI DO TRAUMA DAS ARANHAS. DURANTE AS AULAS PASSAVA O TEMPO TODO OLHANDO PRA CIMA, VIGIANDO, PARA VER SE ALGUMA APARECIA. ESSE MEDO SE ESTENDEU A OUTROS SERES PARECIDOS, TIPO CARANGUEJO, ETC.
MEDO NÃO TEM LÓGICA, É APENAS UMA REAÇÃO, INSTINTIVA, MUITAS VEZES É APENAS UMA DEFESA).

Fonte: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/mente-aberta/me-compadeco-042806909.html

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