segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Cercas.

Por Fernanda Pompeu

Faz quinze anos, todas as manhãs, levo meu cãozinho Chico para passear. Não sei se todo mundo sabe que os cães gostam mais do passeio do que da comida. Os que vivem trancados em casa, é claro. A rua é o momento deles tocarem o mundo e se relacionarem com calçadas, postes, canterinhos de grama, pães abandonados e outros cachorros.

Para mim - que posso me relacionar pelo facebook, twitter, mercados, aeroportos, celular - esses passeios matutinos tendem à monotonia. Sendo que uso monotonia aqui como um eufemismo para tédio. Daí, desenvolvi uma estratégia para entreter o espírito. Enquanto o Chico cheira aqui e acolá, eu vou espiando as casas.

Nosso trajeto é pela fronteira Vila Madalena - Alto de Pinheiros, em Sampa. Isto é, por uma área estritamente residencial. Há frondosas árvores, joaninhas transitando, e um oceano de carros na avenida Pedroso de Morais. Nós dois evitamos a Pedroso, gostamos das ruazinhas.

A rotina dessas caminhadas permite que eu revisite o gosto antigo de olhar a casa dos outros. Meter a curiosidade no jardim e - suprema alegria - na sala de estar. Às vezes até surpreendo moradores em volta da mesa do café da manhã. Ver pessoas dentro de suas casas é um prazer que credito à minha infância carioca.

No Rio, ao menos nos anos 1960, o calor e o preço do ar condicionado faziam com que janelas escancarassem a vida privada para as calçadas. Recentemente, me hospedei em um hotel em Copacabana. Quase fui ao delírio quando da janela do meu quarto pude apreciar várias outras do prédio em frente. A moça penteando o cabelo, o velho dando alpiste para o pássaro engaiolado.

Por tudo isso, me navalha o coração quando dou de cara com um morador subindo muros, fechando a vista de seu jardim, garagem, corredor. Penso que é sempre faca de dois legumes. Da rua, não verei mais a casa. Da casa, ele não enxergará mais a rua. Igualzinho a bloquear alguém, ou ser bloqueado, no Face. Fim de uma possibilidade de diálogo, troca, convencimento.

O que acontece fora também rola dentro. Por medo, insegurança, raiva vamos colocando cerquinhas entre nós e os desconhecidos. Fechamos persianas para que a dúvida do outro não ofusque nossas certezas. Eu me meto em uma couraça, pois quero evitar lanças voadoras. O problema é nem todas vêm envenenadas. Algumas carregam esperança, amizade, novidades.

ELA TEM RAZÃO, ESTAMOS CADA VEZ NOS FECHANDO MAIS, E O CONTATO QUE TEMOS, AGORA É PRATICAMENTE SÓ VIRTUAL. TEM UMA FRASE, DE UM PENSADOR ANÔNIMO, QUE DIZ ASSIM: "Já fomos à Lua e dela voltamos, mas temos dificuldade em atravessar a rua e nos encontrarmos com nosso novo vizinho".
E ELE ESTÁ CERTO. SE QUISEREM LER O RESTO DO PENSAMENTO;
http://pensador.uol.com.br/autor/anonimo/
O TEXTO É BOM.

Fonte: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/mente-aberta/cercas-155001413.html

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